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Lado A Discos Premium entrevista Juninho Jr. (Entrevista perdida de 2004)


Entrevista com Juninho Jr, baterista da banda curitibana Poléxia, realizada em 25 de Junho de 2004 – por Lúcia Porto.

O que te levou a tocar em uma banda de rock?
Minha formação musical é rock. Quando era criança eu ouvia o que todo mundo ouvia, Balão Mágico, Fofão e essas coisas (risos). Depois que peguei uma idade comecei a ouvir Raul (Seixas), então a minha formação começou ouvindo Raul Seixas, isso com oito, dez anos. Meu tio e minha tia gostavam muito de Raul, minha mãe também e às vezes a gente fazia umas reuniões em casa, tomando uma cerveja e jogando uma carta e tal... e eu lá molecão, crianção e eles ouvindo Raul e eu fui começando a me interessar... isso foi no final dos anos 80.

Quando chegou os anos 90, parei de ouvir Raul e comecei a ouvir coisas que estavam rolando na época. Uma banda que gosto bastante porque me lembra muito essa época e que tenho vergonha de dizer é o Roxette. O Roxette foi a primeira banda que ouvi nos anos 90. Depois vieram outras bandas, de 91 pra frente foi o Nirvana e todo mundo na onda do Grunge, depois Radiohead e fui procurando. Fui conhecer direito o Led Zeppelin no meio dos anos 90, 95 – 96 comecei a ouvir Led Zeppelin, aí voltei tudo lá atrás... Beatles, voltando cada vez mais, depois vim subindo, peneirando as coisas que achava legal. 

Por minha formação começar pelo rock, acho que me influenciou a tocar rock, eu tinha os meus ídolos na adolescência que eram os bateristas de rock... então, eu me via tocando como eles, em grandes palcos, com baterias microfonadas e tal... é uma coisa mais visceral digamos assim. Há alguns anos atrás que comecei a conhecer mesmo a música brasileira, estudando e tal, comecei a ver que a música não é só 4/4 com bastante força, que é legal. É bom você tocar um samba, é bom saber tocar jazz, pelo menos o básico. O rock está na veia, não adianta, por mais que você ouça Chico Buarque, por mais que você ouça Quarteto Novo, por mais que você ouça Flora Purim, que eu gosto bastante, você vai para o rock, não adianta. Você tem uma influência, mas o rock está no sangue.

Quando você era adolescente e se interessou pelo rock você acreditou no discurso dos “rock stars”? 
Eu acreditei, mas depois de um tempo não acreditei tanto assim. Você vai crescendo e vai vendo que o mundo é diferente, e é difícil ter alguma coisa para acreditar dentro do rock. Acho que o Kurt Cobain fazia o que fazia com muita sinceridade. Eu ainda acredito, não sei se daqui a cinco ou dez anos vou acreditar nisso, mas creio que o que ele fez era com muita vontade e ele realmente gostava do que fazia, para mim o discurso dele era verdadeiro. Acho fácil acreditar em um discurso como do Led Zeppelin, que era uma banda de verdade, como o The Who, existem bandas e bandas, cantores e cantores, cada um com a sua ideia do que é música e do que eles querem passar para o fã entende?

Você acha que há identidade no rock brasileiro? Como é fazer rock em um país marcado por outros ritmos mais populares?
Acho que o rock brasileiro tem identidade sim. Só que a molecada que ouve som hoje dia... eu mesmo há dez anos ouvia muito rock internacional, ninguém começa ouvindo Quarteto Novo. Ninguém que começa no mundo da música hoje começa ouvindo esses caras, justamente porque eles não estão na mídia. Acho que é legal o pessoal saber sobre isso. O próprio rock nacional dos anos 80 era muito calcado no rock inglês. Isso a galera vinha ouvindo, do final dos 70, da explosão do punk pra cá, eles vieram ouvindo tudo e acabou surgindo um movimento nos anos 80, Legião, Paralamas, essa galera toda aí.

Acho que é legal você saber ouvir de tudo, e fazer uma boa mistura, o que é difícil hoje em dia. Hoje em dia o pessoal só faz uma coisa, quem faz rock faz rock, quem faz MPB faz MPB, quem faz samba faz samba. Ninguém mistura mais como Raul Seixas, para mim ele é um dos caras que teve grande identidade musical. Ele sabia ouvir rock dos anos 50, ele soube ouvir o punk, ele soube ouvir o baião, ele misturou tudo, Jerry Lee Lewis com Luiz Gonzaga, isso é uma coisa que ninguém faz hoje em dia, isso ele fazia no começo da década de 70. Acho que a identidade do rock brasileiro é essa, a mistura. Se você for fazer música brasileira vai fazer o quê? Samba? Axé? Isso não é Brasil. Isso reflete uma pequena percentagem da população brasileira do sudeste e do nordeste.

Onde esteticamente você acha que a Poléxia se situa?
Essa é a pergunta mais difícil que a gente tem respondido nos últimos dois anos, porque a gente não sabe. São muitas influências, acho que fazemos rock com açúcar pop. Temos um pé no rock, um pé no pop, mas as influências são muitas. Eu comecei ouvindo Raul Seixas e hoje ouço até Rage Against The Machine. O nosso baixista adora o Naná Vasconcellos, eu sou apaixonado pelo Airto Moreira, o vocalista gosta muito das bandas inglesas, tanto dos anos 80 quanto dos anos 90. Mas não podemos misturar tudo porque senão vira uma salada, você tem que saber dosar as influências, mas acho que juntando tudo isso a gente acaba fazendo um rock nacional meio poético, mas com um pouquinho de influência brasileira, mesmo que apenas nas letras.

O que você acha que é o sucesso?
(...) Cara (...). Acho que é ser reconhecido pelo trabalho que você faz, independente do tipo de trabalho, gostando do teu trabalho e realizando – o com vontade, com amor mesmo. Ser reconhecido pelo que faz pelo que gosta de fazer. 

E a questão financeira?
Isso é consequência, cara. Depende do tipo de trabalho que você esteja fazendo, se for um trabalho cover, acho que você tem que pensar muito na grana sim. Agora, acho que você não pode tentar obter o sucesso através da música cover. Já com música própria é outra história, acho importante você estar gostando do que faz, gostando do que você toca, com um trabalho autoral a grana é consequência. Se você fizer um trabalho bom e for reconhecido, a grana vem como consequência, ou seja, demora mais. 

Você acha que a Poléxia já é um sucesso ou se tornará um sucesso?
Acredito que se tornará sucesso, acredito e espero em Deus e estamos trabalhando pra isso. É impossível dizer se já somos ou não um sucesso,  a gente está trabalhando para chegar lá, aonde todo mundo quer chegar.

Quanto tempo você acha que isso vai levar para acontecer?
Espero que o mais rápido possível, mas vendo o panorama de Curitiba e do Brasil para música própria acho que vai levar um tempo. Acredito, e espero estar certo, que daqui uns três anos você tenha ouvido falar bastante da gente.

Você acha que três anos, mais dois que você tem de banda são cinco, você acha que cinco anos é um tempo bom para saber se as coisas caminharam do jeito que você queria?
Na verdade é um tempo bom, mas ao mesmo tempo é um tempo curto. Porque cada ano que passa você tem um trabalho diferente, amadurece no teu instrumento, na tua profissão, na visão do teu trabalho. Os dois discos que lançamos são bem diferentes um do outro, o EP e o Acústico, e a diferença não é nem de um ano. Esse que está chegando agora “O Avesso” é completamente diferente dos outros dois. Daqui um ano vai ser diferente, vamos estar trabalhando diferente.

Você acha que vai chegar um ponto em que a Poléxia vá ter a oportunidade de assinar um contrato? O que te leva a acreditar que isso possa acontecer ou não?
Acho que talvez aconteça, mas vai ser difícil, há uma possibilidade, mas é pouco provável. Ninguém está investindo em banda nova no Brasil de hoje, e com a pirataria do jeito que está, com o preço absurdo do CD, acho que até pela nossa falta de interesse talvez não aconteça. Nós estamos querendo trabalhar independente até quando for possível. Já tive oportunidade de receber duas propostas de gravadora nas outras duas bandas que tive, mas não assinamos, era um contrato muito unilateral. 

Todo mundo que vive de música no Brasil sabe que as únicas que tiram proveito desses contratos com bandas novas são as gravadoras. Então, a gente quer evitar isso, pelo menos por enquanto. Acho que a gente tem que estar em um nível muito bom para poder fazer um contrato muito bom. Se não, sairemos perdendo e é muito melhor trabalhar independente, mesmo que seja em um nível menor de arrecadação de vendas, do que vender muito e acabar preso em uma gravadora.

Como você vê o mercado fonográfico independente no Brasil que é um país de economia instável? Normalmente o CD é a primeira coisa que a pessoa vai retirar do orçamento.
Às vezes um CD de uma banda conhecida ou de um estilo mais popular custa R$ 30,00 e o pessoal vai lá e compra, por que não comprar um CD de uma banda nova independente com qualidade por R$ 15,00 ou R$ 20,00? Não só o nosso, mas tem muita banda lançando CD aí nesse nível.

Você tem ideia de quem é o público da Poléxia?
Acho que é o pessoal interessado em conhecer coisas novas. Eu não diria boas porque parece pretensioso, mas a gente tá aqui abrindo o jogo, aliás eu estou na banda porque acho que a banda é boa. Para não ser pretensioso acho que é o pessoal interessado em ouvir música sincera, que a gente considera como qualidade.

O CD da banda vai estar fácil de encontrar?
Não tão fácil como os CDs de bandas com grandes gravadoras, mas a gente vai tentar uma boa distribuição mesmo que independente. Vamos fazer um bom número de cópias (mil) para começar e vamos tentar distribuir o máximo que a gente puder. Vai ter na Vinyl Club também.

Para encerrar Juninho, fique a vontade para fazer suas considerações finais.
É difícil viver de música, mas as coisas ficam mais fáceis se fizermos o que acreditamos. Claro que todo mundo quer um bom cachê, ter sua casa, poder sustentar a família com a música, como qualquer outro profissional. Eu não estaria fazendo o que não gosto para tentar chegar a algum lugar. Sucesso e dinheiro é consequência do teu trabalho, se você faz um negócio com sinceridade, dando muito de você, do teu esforço, acho que as pessoas perceberão isso.

Ouça Poléxia com "Violetas na Janela" do álbum "O Avesso" de 2004.

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