Quando a segunda geração do rap nacional começou a fazer sucesso ali por volta de 2011, fiquei bastante impressionado. O rap nunca foi um estilo bem visto pelo mundo da música, pelo menos não no mundo que eu estava. Havia um preconceito de linguagem, o que o pessoal do rap fazia era completamente diferente do que se ensinava na universidade. Havia também um preconceito social, o rap vinha da periferia de São Paulo e a morte do rapper Sabotage em 2003 só piorou as coisas. Por isso, quando o sucesso veio para a segunda geração pensei: como esses caras conseguiram superar tantos obstáculos? Em busca de respostas passei a acompanhar de perto o trabalho de alguns nomes de sucesso do rap nacional.
Apesar de conhecer alguma coisa do pessoal da primeira geração, praticamente deixei de lado o rap enquanto fui professor na escola pública. Mesmo na periferia, naquela época o rap não era bem visto. Cheguei a ignorar em um caderno de um aluno a letra inteira de "Da ponte pra cá" dos Racionais Mc's porque simplesmente não conhecia a música, fui me dar conta disso anos depois. Em 2012 fui pra São Paulo, já não era mais professor da escola pública e estava começando a Lado A Discos. Fui comprar alguns discos e acabei trazendo quatro exemplares do "Nó na orelha" do Criolo em vinil branco. Acho que fui o primeiro a ter o vinil dele para vender em Curitiba.
Meu interesse pelo sucesso da segunda geração do rap nacional me fez estreitar as conversas sobre o estilo com um amigo de longa data, que era a pessoa que mais sabia sobre rap que conhecia - o Bira. Foi através dele que conheci alguns nomes do rap em Curitiba, entre eles o Cilho. Para mim era algo extraordinário alguém fazer rap em Curitiba, vinha da cena do rock e sabia que as coisas não eram fáceis, imagine para o rap? Precisava ver se aprendia alguma coisa com eles, reavaliei vários conceitos que tinha com o pessoal do rap com o passar dos anos, e algo que aprendi foi acreditar nas coisas. Não é qualquer pessoa que se aventura pelo mundo da música e não é qualquer músico que se aventura pelo mundo do rap e para fazer as coisas acontecerem precisa acreditar.
Luis Cilho está completando uma trilogia, com os EPs "Ontem" (2010), "Hoje" (2011) e o álbum "Amanhã" (2016). Está no corre desde o ano 2000 e por isso seu trabalho traz muita influência da primeira geração do rap nacional. "Para nós de Curitiba a maior referência de uma possível primeira geração do hip-hop seria o DJ Primo (1980 - 2008), houve vários grupos mas com pouca repercussão..." Essa é uma visão que o Cilho me deu do panorama do rap em Curitiba, particularmente não conhecia o DJ Primo, apenas ouvi falar por alto do Davi Black e só.
Cilho também cita a influência do rapper carioca MC Marechal e do extinto grupo "Quinto Andar", mas o que influenciou a sua musicalidade foram os americanos do Jurassic 5. A mudança para "SÍMIO" representa um recomeço. Na capa o menino de frente para o deserto deixando o nome "Cilho" para trás. Se reparar com cuidado verá "Luis Cilho" escrito nas areias do deserto, na contracapa a areia do tempo, talvez representando a idade. Cilho está com 32 anos e não é mais aquele menino de dezesseis anos que começou a trilhar o caminho do rap lá no ano 2000.
É um privilégio para a Lado A Discos estar com a logomarca na contracapa desse trabalho que coloca Curitiba mais uma vez no cenário do rap nacional. É um crescimento para a marca com a qual venho trabalhando desde 2012. Nada foi fácil, como diz a letra de "Camomila", faixa que abre o disco: "eu aprendi na rua não 'tava na apostila".
(publicado originalmente em agosto de 2016)
Veja Símio em "Camomila".
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