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Minha carreira literária (parte dois)

 

Em 2003 basicamente tinha três contos e um artigo sobre a história da guitarra elétrica publicados, na época acreditava que poderia trilhar um caminho profissional escrevendo sobre música. Foi uma decisão pensada, deixei a literatura e a vida nos palcos de lado para me dedicar a escrever sobre a arte dos sons. Não é fácil admitir, mas nunca lidei bem com a realidade e talvez fosse mais sensato arrumar um emprego comum. No entanto, fui fazer uma pós em MPB e conheci uma menina tão sonhadora quanto eu - ela estava fundando um jornal. Ela me convidou para trabalhar no projeto e sugeri assinar uma coluna sobre música - a "Phonoclub". Ela aceitou. 

Sempre gostei de colunas musicais, na Gazeta do Povo havia uma chamada "Melhores do Rock" - que eu lia na adolescência (tenho algumas guardadas por aqui) - e existia a emblemática "Discoteca Básica" da extinta Revista Bizz.  Queria que a "Phonoclub" soasse clássica e por isso escolhi para estrear a coluna falar sobre os New York Dolls

Trabalhei em algumas edições seguindo o caminho das bandas clássicas, mas em algum momento percebi que precisava me aproximar das bandas paranaenses. Minha intuição dizia que continuar escrevendo sobre bandas clássicas não me levaria a lugar nenhum e nessa época tive contato com uma banda que estava começando em Curitiba, a Poléxia. Ainda não sabia, mas o nome da banda era uma referência ao filme Quase Famosos (Almost Famous) lançado no ano 2000 - que conta a história de um garoto de quinze anos que consegue um emprego na revista Rolling Stone e seu primeiro trabalho é acompanhar uma banda em turnê pelos EUA, (Poléxia é uma das groupies da banda).

Ainda estamos em 2003 e tinha pouco conhecimento da cultura rock que basicamente para mim se resumia a revista BIZZ e ao Rock in Rio. A revista Rolling Stone só começou a ser publicada em versão brasileira em 2006 e a partir de então fui entender que a publicação feita da revista por aqui nos anos 70 é considerada uma versão pirata (aliás, bem difícil de encontrar). A Rolling Stone americana é publicada desde 1967 e é considerada referência no mundo do rock. Mais adiante a Poléxia fez um sucesso considerável em Curitiba e apareceu em um momento ou outro dentro do cenário do pop rock nacional.

Em junho de 2004 com pouco mais de um ano de jornal consegui realizar uma entrevista que considero a mais significativa da minha carreira - conversei com Waltel Branco (1929 - 2018). Conhecia o trabalho dele de passagem, mas sabia que era um nome importante da Música Popular Brasileira, insegura chamei um amigo para me ajudar a formular as perguntas. Foi uma entrevista significativa porque pude perceber o quanto o mundo da música era surpreendente. Seu Waltel tinha produzido e vivenciado muito dentro desse universo e, no  entanto, circulava praticamente anônimo pelas ruas da cidade. Uma das perguntas que me fiz mentalmente (não comentei com ele) foi: o que exatamente aconteceu para que ele estivesse no anonimato?

Não era uma questão fácil de responder aquela altura, mas uma das respostas possíveis é que o Seu Waltel tinha começado a carreira em uma época praticamente esquecida pela historiografia da Música Popular Brasileira, os anos 40 e 50. Lacuna essa que só será abordada mais detalhadamente com o lançamento do livro "A noite do meu bem"  - A história e as histórias do samba - canção, do Ruy Castro em 2015. Acreditava que o trabalho que vinha desenvolvendo no jornal era relevante, mas de alguma forma ele não encontrava eco, não havia nada que eu pudesse fazer a não ser esperar.

Dizer que não houve repercussão talvez seja exagero. A entrevista que realizei com o Seu Waltel foi publicada em uma revista de São Paulo no final daquele 2004. A poeira Zine era uma revista com pouco mais de um ano de circulação e através de contatos com o editor a matéria foi parar na publicação, inclusive com chamada na capa. Apesar do bom momento o mercado de revistas e jornais estava mudando e dificilmente alguém arrumaria um emprego em revistas de música ou cadernos de cultura. O jornal para qual escrevia a coluna "Phonoclub" havia fechado um mês antes de sair a edição da poeira.

Mesmo a revista Bizz voltando a circular em 2005 (ela havia fechado em 2001 sendo publicada apenas em edições especiais) seu retorno duraria menos de dois anos, em 2007 fecharia definitivamente (pelo menos até agora), um pouco pela chegada da Rolling Stone em 2006.

A poeira Zine levaria alguns anos até se estabelecer como marca e escrever para a Rolling Stone ainda não era uma possibilidade. Tinha terminado a pós em março de 2004 e mesmo com uma matéria citada na capa de uma revista já tinha a sensação que havia chegado a um beco sem saída e que não haveria lugar pra mim no mercado. Continuei a escrever movida pela paixão, porque as ilusões estavam todas perdidas.

Minhas primeiras publicações na internet são de 2004. São de um antigo site do Recife/PE chamado Vitrolaz, que infelizmente saiu do ar. Fiz coisas interessantes por lá, resenhei o histórico show de retorno da banda paranaense A Chave 25 anos depois da sua dissolução, cobri o show do grupo curitibano de música brasileira Baque Solto no Teatro Paiol e fiz uma matéria sobre o CD Let it Bed, Let it Bed do ex Mutante Arnaldo Baptista também lançado naquele ano. Com o fim do site passei a fazer releases para bandas independentes, a maioria frequentadora da Vinyl Club, lendária loja de discos de Curitiba.

Por volta de 2006 / 2007 comecei a trabalhar com um blog próprio, era um serviço gratuito oferecido pelo IG - o Blig. Publiquei várias coisas, mas o IG retirou o serviço do ar e perdi todas as postagens, só restou uma resenha que imprimi do show que Roger Waters fez em São Paulo tocando o Dark Side of the Moon. Eu estava lá. Mais tarde passei a colaborar com um amigo em outro blog chamado Café & Música onde resenhava CDs, livros e filmes. Nesse tive o cuidado de imprimir os textos. O Café & Música também não durou muito. Seguindo adiante fundei a Lado A Discos, mas aí já é outra história.

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